Blog do Dina - Eleições geram silenciamento e rachas geracionais em famílias


Eleições geram silenciamento e rachas geracionais em famílias

22 de agosto de 2022 às 8:55

Calar-se sobre política foi a estratégia adotada por Marcelo Moretti Fioroni, 52, para conviver com o pai, um bolsonarista de 82 anos. A discordância gerou discussões e a sensação de solidão e angústia.

"Tem horas que eu argumento e chego a bater boca com ele. Nunca imaginei fazer isso", afirma o engenheiro, que começou a fazer terapia antes da pandemia de Covid e viu as crises devido a debates políticos se tornarem o assunto predominante das sessões. "Virei a ovelha vermelha da família."

Evandro Botteon, 37, e a sogra Solange Sales Araújo, 61, também selaram um pacto de silêncio há dois meses, após uma discussão durante um jantar da família, em Campinas, virar uma confusão que fez o genro deixar o local. No dia seguinte, vieram o choro de arrependimento e o pedido de perdão.

O petroleiro diz ser uma pessoa "atravessada pela política" e que as relações se acirraram na família a partir de 2018, quando Jair Bolsonaro (PL) se elegeu.

Já a advogada afirma que evita mencionar o nome do presidente para não gerar desconforto e que não vê problema em ter filhos e irmãs com posicionamento diferente. Para evitar brigas com elas, apoiadoras de Lula (PT), diz ter silenciado notificações no WhatsApp.

Na família de Cláudia Alvarenga, 53, o silêncio sobre política começou há mais tempo, desde 28 de outubro de 2018, quando uma cunhada e uma irmã compartilharam postagens celebrando a eleição de Bolsonaro, rebatidas com comentários críticos pelas filhas da empreendedora.

"O problema não é ter uma posição diferente. Só que o diálogo fica escasso, e situações desconfortáveis e sentimentos são empurrados para debaixo do tapete", afirma Alvarenga. Para ela, a terapia não chega a resolver a questão, que afeta o sono e causa irritação. Evangélica, tem recorrido ao lado espiritual.

Marina, 20, uma das filhas envolvidas no episódio, define a relação familiar como engessada, com regras sobre o que pode ou não ser dito nos encontros. Ela diz ter sido bloqueada nas redes pela tia, que não quis falar com a reportagem.

"Até hoje me sinto um pouco desconfortável, mas bem menos do que antes. Entendo que são posicionamentos diferentes e que não estou aqui para convencer alguém de um lado ou de outro, mas é ruim, porque queria que a gente conseguisse conversar, o que infelizmente não acontece."

Inferno é a palavra usada pela maquiadora Juliana Thais, 27, moradora de São José dos Campos, para definir o ano de 2018. Ela diz que chorava com os insultos do pai, um bolsonarista. Há dois meses, decidiu se distanciar e morar com o noivo, o que melhorou a relação com o familiar, marcada por provocações.

A mãe de Juliana, a dona de casa Tamára Ulrich Paes dos Santos, 51, identifica-se como de direita. Mas em vez de expressar seu ponto de vista, ela diz que tenta manter a neutralidade em casa, porque a situação familiar "causa tristeza", com o marido "mais agressivo com parentes do que com pessoas de fora". Para ela, há imaturidade de um lado e intolerância do outro.

Segundo pesquisa Datafolha realizada de forma presencial com 2.556 pessoas no final de julho, 49% dos eleitores deixaram de falar sobre política com pessoas próximas. A situação atinge 54% dos que declaram voto em Lula e 40% dos que apoiam Bolsonaro. Do total, 15% disseram ter recebido ameaça verbal, e 7%, física. Situações de constrangimento por posições políticas nos últimos meses foram relatadas por 54%.

Veja a matéria completa.

Folha de S. Paulo

Comentários [0]


Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.